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quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Breve comentário sobre "Breve"

Somos recebidos pelos atores na entrada. Eles também nos dirigem até uma cadeira das muitas que cercam o local onde irá ocorrer o jogo de interpretação.
Bebemos cervejas, vinhos e comemos pães de queijo que nos foram servidos no início. Em meio a este aconchegante ambiente começa a peça. Cada um dos personagens (que eram bem distintos, fisicamente) começam ali a fazer devaneios sobre o amor, a amizade,os medos, a vida.

Há pelo menos um momento de foco para cada um dos personagens. Este foco é como uma porta que se abre para a intimidade daquele que está falando. Eles falam de alguém (ou de algo) que embora tenha sido breve, ou o que tenha ficado presente seja muito pequeno, esses momentos acabam tomando um lugar de sublime importância na formação do próprio caráter de quem aquilo viveu.

E assim vão tecendo uma teia de “pequenos momentos da vida” que justamente pela simplicidade tronam-se experiências completas destinadas à eternidade. Um sorriso, uma carta, uma boneca, um vento do verão, a imagem de um arco-íris, um choro, uma crise, um grito, conselhos de avó, colo de mãe, bolo da tia. São coisas que se isoladas soam sem importância; mas se entendermos como um símbolo de uma nostalgia que nos faz palpitar o coração, ganha um sentido indispensável.

 A forma intimista, a disposição dos atores, os textos que eram falados diretamente no olho de alguém da platéia nos fazia questionar inclusive se eram realmente personagens ou se estavam falando da própria vida.

Essa dúvida sutil, na minha opinião, agregou mais beleza ao espetáculo que se desenvolveu de uma forma pessoal mas, ainda assim, conseguindo levar também um pouco de dúvida e mistério.

Com direção de Thiago Romero e elenco formado por seis jovens atores, constituem a Cia. Teatro da Queda; Breve, é o primeiro resultado do grupo com residência no Teatro Vila Velha, em Salvador-Bahia.

http://www.teatrovilavelha.com.br/noticias-gerais/312


quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Sobre o nome: "no compasso baiano"

  Escolhi esse nome para o blog pois acho que ele expressa exatamente o momento que estou vivendo. Sai de São Paulo, uma cidade enorme com um ritmo próprio, com todo um jeito das pessoas se relacionarem, se aproximarem, viverem seu cotidiano, fugirem do seu cotidiano (porque em São Paulo a fuga se faz necessária), enfim, todo um funcionamento característico que, embora me incomodasse muito, era o jeito que eu estava acostumada a lidar com o que me cercava.
  Aí, eu vim pra Bahia. E, assim como São Paulo ou como qualquer outro lugar do mundo, tem seu jeito próprios de acontecer.
  Klauss Vianna, bailarino, coreógrafo, preparador corporal e professor nasceu em Belo Horizonte. A história de sua vida e de sua dança (que ele insiste inclusive serem indissociaveis) foi contado por ele no livro "A dança". Este livro é constituído de basicamente duas partes (a vida e a técnica) cada qual formadas por sete capítulos.
  O terceiro capítulo da parte "a vida" leva o nome de "o compasso baiano". É o relato de Klauss sobre os dois anos em que viveu em Salvador, Bahia, dando aulas na Escola de Dança da Universidade Federal: a UFBA.
  Ele começa contando que, em 1959, ele e sua mulher Angel Vianna (ainda viva e atualmente dona da Faculdade Angel Vianna, no Rio de Janeiro) fundaram o Balé Klauss Vianna, em Belo Horizonte e três anos depois participavam do I Encontro de escolas de dança. Ele conta que só haviam coreografias de cisnes " (...)era morte do cisne, solo do cisne, voô do cisne." enquanto ele levava ao palco o trabalho "a face lívida" onde uma bailarina atravessava o palco vestida de santa barroca, o que gerou "muita gente vaiandi e alguns poucos aplaudindo".Mas a coreografia foi vista por Rolf Gelewsky e Lia Robatto que convidaram Klauss para dar aulas na UFBA.
  Este ano aqui na Escola, nós tivemos uma palestra/conversa com Lia Robatto no Teatro do Movimento na semana comemorativa à Rolg Gelewsky. Neste dia ela contou várias histórias ocorridas entre ela, Rolf e Klauss.
  No livro Klauss fala de Rolf: "um alemão que quase não falava português" de um jeito que me faz relacionar com uma figura muito ativa na Escola hoje em dia, que é David Ianninteli, marido de Leda Ianninteli, diretora atual da Escola de dança.É americano e vive na Bahia à alguns anos. Ao meu ver, David é o professor mais ativo da Escola: ele é disponível, empenhado e muito apaixonado pelo que faz. Sua pesquisa é voltada principalmente para a técnica "contact improvisation" além de dar aulas na graduação de processos criativos em dança. A aula de contato e improvisação, que ocorre as quartas-feiras das 16h30 ás 18h30, é o único curso dos 16 cursos de extensão que gratuito e aberto desde seu início, à quatro anos atrás.
  Mas, voltando ao Klauss, ele desenvolve o capítulo contando de como ele inseriu a capoeira angola como matéria curricular, embora cuidasse do setor da dança clássica. Isso mostra como ele começou a ser contaminado pela cultura baiana, processo este muito parecido com o que estou vivendo. Ele continua dizendo que conheceu o anatomista Antonio Brochado que fazia parte do candomblé: cita inclusive um ritual de iniciação de moças jovens que ele e Angel tiveram a oportunidade de ver, Conta também de como conheceu Caetano e Bethânia e, posteriormente, inseriu a música ao vivo em suas aulas.
  Por fim ele relata que foi na UFBA que começou a perceber que a dança não estava separada do mundo lá fora, principalmente no que se refere à política. Ser artista é ter um papel/ posicionamento político. E, em um contexto de ditadura militar, os alunos da Escola de Dança estavam muito mais preocupados com o que fazer enquanto estudantes e cidadãos, para além de ser bailarino.
  Klauss frequentou reuniões políticas dos alunos e diz: "Fui notando que nos encontros políticos havia uma harmonia entre eles que não existia na sala de aula." e ainda "O ser humano que existe no bailarino precisa estar atento a receber tudo lá fora, nas ruas. É impossível dissociar vida e sala de aula".
  Eu vim até a Bahia para estudar dança. E mesmo estando no Primeiro ano já estou na chapa do Centro Acadêmico que assumiu em maio. Vivemos um momento na Escola em que faziam dois anos que não tínhamos um centro acadêmico. Diferente dos alunos da época de Klauss, a galera atual é totalmente alheia à questões políticas no que diz respeito a este coletivo que formamos de 256 alunos da graduação. Foi difícil inclusive das pessoas votarem em uma chapa.
  Enfim, faço deste momento uma formação artística, acadêmica e política. E sinceramente acho que todos nós deveríamos fazer isso, seja onde for, sem precisar ir até a Bahia. Faça da sua formação, mesmo que seja em uma Anhembi-morumbi da vida, uma formação completa que articule o que você gosta de fazer com o seu jeito de estar no mundo.