O solo intitulado “Piranha”, de
Wagner Schwartz, foi apresentado na PID (Plataforma Internacional de Dança)
realizada na cidade de Salvador, nos dias 7 e 8 de Dezembro de 2012. Eu pude ir
à apresentação do segundo dia, às 18horas.
Entramos no
teatro e logo a luz se apaga. Começa a passar um vídeo juntamente com um som de
interferência e microfonia. Esse vídeo consistia basicamente em um diálogo da
tela com os espectadores, sendo apresentado um pequeno texto, porém com uma
frase de cada vez, dando o tempo de se ler e compreender pouco a pouco o que
estava sendo dito. As frases diziam algumas informações e diferenciações
características do peixe piranha: origem do nome, diferentes nomes, o que come,
onde vive etc. Isso intercalado por alguns momentos de imagens digitais, que
mais pareciam códigos ou algum tipo de configuração.
Depois de
aproximadamente 15 minutos de imagens projetadas, a tela e a luz se apagam
novamente. Entra o artista. Coloca-se no canto direito do palco com uma luz
fria que vinha de cima para baixo. Suas roupas também trazem a frieza das
cores: uma camisa cinza básica e uma calça cor de gelo.
Não sei
exatamente que adjetivo usar para a qualidade de movimento que ele começa a
explorar no palco. Algo como “tremer” ou “vibrar”, num movimento constante que
muda de escala ao longo do tempo. Durante 40 minutos essa qualidade de
movimento é a única explorada, e aquilo que se inicia leve e sutil, vai
crescendo progressivamente, não como uma mudança clara de intensidade e
velocidade, mas como um aumento natural da reverberação de um movimento
contínuo no corpo. Não há um momento específico em que o movimento amplia e se
transforma, pois isso é um processo percorrido de forma gradual, onde o corpo
passa pelo limiar do movimento voluntário e involuntário.
Essa
qualidade do tremer ou vibrar, juntamente com a camiseta de tecido mole,
constrói uma imagem associada diretamente ao nome “piranha”, principalmente
pelo fato de ser um peixe: O artista se coloca em movimento como de um peixe
fora d´água, agitado e instintivo, respondendo apenas às próprias necessidades
decorrentes do estado corporal em que ele se coloca.
Atrelado a
isso os fortes sons de ruídos altamente tecnológicos e digitais que persistem
do começo ao fim. Som e movimento permanecem numa mesma linha do começo ao fim,
transformando-se por uma reverberação progressiva, o que me leva a lembrar da
palavra “transe”. Esta palavra é delicada de se colocar, pois há diversos
entendimentos diferentes e enraizados em seus próprios contextos ou áreas do
conhecimento. Portanto, coloco transe aqui como algo proveniente de uma longa
repetição, que se prolonga constantemente de forma a gerar drasticamente um
estado corporal alterado, distante do estado experimentado na vida cotidiana.
É com a
exploração dessa intensa repetição, que Schwartz cria a diferença. Não é
possível dizer que ele fez a mesma coisa estes 40 minutos. É no fazer constante
que se encontram, nos lugares mais sutis do corpo do artista, as
características especificas daquele corpo, que nenhum outro pode fazer igual. É
a exploração da qualidade de movimento tremer, que não necessariamente é uma
novidade do campo da arte contemporânea, mas é o jeito que essa pessoa
específica, no caso Wagner Schwartz, encontrou de levar para a cena tal experiência
de corpo.
Sua última
ação colocada em cena é o momento em que vira o tronco para traz em direção
sagital, e deixa completamente visível o movimento de abrir e fechar das
costelas, provocado pela respiração intensa após tanto tempo de repetição progressiva.
De volta a uma escala micro do
movimento, associando ao estado-peixe mais uma vez, suas costelas lembram o
movimento de guelras fora d’ água.
Cria-se um
estado corporal e isso interfere no estado pessoal de todos que estão ali,
olhando pra ele. Alguns cansados, outros angustiados, outros simplesmente
pensativos. Todo tipo de obra sempre irá afetar diferentes pessoas por
diferentes motivos, de acordo com o estado de cada um naquele momento,
fazendo-nos associar com as experiências que temos até aquele exato momento. E
aí, saímos, carregando mais uma experiência nova, associando com nossa arte, ou
com nossa vida, ou com nada. Mas observando a disponibilidade de um artista em
compartilhar com o mundo sua inquietação pessoal, que nunca saberemos
exatamente de onde vem.
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